quinta-feira, 20 de julho de 2017

Lei abre brechas para terceirização no setor público e pode diminuir concursos

Projeto foi aprovado pela Câmara

Projeto foi aprovado pela Câmara Foto: Givaldo Barbosa / Agência O Globo
Bruno Dutra e Nelson Lima Neto
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Aprovado na noite da última quarta-feira, no Congresso Nacional, o Projeto de Lei 4.302/98, que permite a terceirização irrestrita no país, inclusive no serviço público, já causa polêmica. No caso do serviço público, como não há vedação expressa no texto, a legislação abre brecha para que se terceirize setores do funcionalismo, a exemplo de escolas, hospitais e atendimento ao público em órgãos.
A exceção da terceirização será para atividades essenciais ao Estado, como judiciário e policia. Outras funções, mesmo que ligadas a atividade-fim, poderão ser terceirizadas em órgãos ou empresas públicas.
— O projeto em relação à terceirização é muito abrangente e dá margem para que este tipo de contratação seja feita nas mais variadas áreas do serviço público, o que é bastante preocupante. Este novo processo nas relações de trabalho do país pode abrir precedente perigoso no setor público, que pode sofrer ainda mais com a ineficiência — avalia Ângelo Costa, presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho.
A aprovação do projeto, completa Costa, que permite a terceirização em todos os setores, e de forma irrestrita, burla o conceito essencial do concurso público, que é o acesso democrático a esta carreira. Desta forma, alerta ele, o poder público pode desistir de realizar concursos, muitas vezes onerosos para os cofres públicos, e optar pela terceirização.
— O Estado pode deixar de fazer concursos públicos e passar a contratar empresas prestadoras de serviço. Assim, funcionários que não terão direito algum à carreira,vão exercer funções dentro da máquina pública — destaca
De acordo com dados mais atualizados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o Brasil tem aproximadamente 12 milhões de trabalhadores terceirizados, o que equivale a cerca de 27% do número total de profissionais com contrato de trabalho formal. A preocupação, para a ANPT, é de que o número de trabalhadores nesta condição aumente no Brasil, em desrespeito à realização de novos concursos ou mesmo à nomeação de aprovados em certames já realizados.
— Nós podemos enfrentar um processo de não nomeação para quem já foi aprovado e, sobretudo, um processo mais doloroso, de exoneração daqueles que já estão na função, mas ainda não obtiveram a estabilidade — explica Costa.
Responsável por administrar um Estado em crise, o governador Luiz Fernando Pezão vê com ressalvas a questão da lei.
— Pelo que entendi, a lei foca mais no setor privado e o concurso público é necessário para a Previdência (mais ativos para contribuir). Para esse momento, não acredito que afete em nada — disse Pezão.
Para o professor Istvan Kasznar, professor de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (FGV) , a lei pode oferecer ao setor público uma oportunidade de enxugar postos que são desnecessários atualmente.
— No setor público, temos uma série de funções que são desnecessárias. Temos uma enorme quantidade de empregos que já não condizem que a necessidade da população e que podem ser terceirizados. Porém, acredito, a questão em debate está muito mais focada no setor privado, mas as regras têm de ser claras para os dois lados — disse.
Vale destacar que o projeto aprovado ontem pela Câmara dos Deputados e que libera a terceirização de forma irrestrita ainda não é o texto definitivo que vai regulamentar esse tipo de contratação no país. Ele será complementado por outro projeto em tramitação no Senado.
LEI NÃO VINGARÁ NO SERVIÇO PÚBLICO, DIZ ESPECIALISTA
Para o juiz federal William Douglas, o texto, ao abrir esta possibilidade, se torna inconstitucional, “pois a constituição brasileira, no inciso segundo do artigo 37, prevê que o acesso ao funcionalismo deve ser feito através de seleção pública, com regras preestabelecidas. Assim, acredito que não terá aplicação no setor ".
Ao permitir a terceirização, segundo a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho, sem limites e garantias, o PL 4.302 tornará mais grave a crise econômica e de arrecadação do Estado, pois, ao permitir a redução material de direitos e benefícios, mediante a diminuição significativa da renda do trabalhador, acarretará na redução da arrecadação de impostos.
— Ao liberar a terceirização para quaisquer das atividades das empresas e do Estado, veremos o crescimento dos índices de desemprego no Brasil, o que possibilitará a redução de direitos dos trabalhadores brasileiros, dentre eles remuneração e benefícios — aponta Ângelo Costa.
Atualmente, jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST) proíbe terceirizar atividade-fim da empresa. Por exemplo, uma escola não pode terceirizar os professores, assim como hospitais não podem terceirizar médicos.

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