Inquérito apura se médico e funcionária cobravam irregularmente para realizar cirurgias e internações de pacientes com câncer no hospital
O Ministério Público Estadual (MPE) instaurou inquérito civil para apurar eventuais irregularidades praticadas, em tese, por funcionários e médicos do Hospital do Câncer Alfredo Abrão, em Campo Grande.
A intenção é esclarecer se houve pagamento irregular ao médico Fabrício Colacino Silva pela prestação de serviços a seis pacientes, por parte do hospital ou pelo SUS (Serviço Único de Saúde). O oncologista é casado com Rafaela Moraes Siufi Silva, filha do médico Adalberto Siufi, que é o principal alvo da Operação Sangue Frio, da Polícia Federal.
Denúncias apontam que notas fiscais teriam sido subfaturadas, apontando possível prejuízo ao hospital. Conforme apurado, não houve pagamento do médico ao hospital após procedimentos, nem gerada nota fiscal dos serviços hospitalares. A funcionária responsável pelo setor de faturamento teria deixado de cobrar os pacientes através de notas legais, sendo que o próprio médico teria recebido parte dos valores diretamente dos familiares.
Em um dos casos, ocorrido em 2014, a filha de um paciente narra que o seu pai teria sido internado no hospital e, dois dias depois, transferido para um quarto isolado, mediante o pagamento de R$ 8 mil, informado pela chefe do setor de faturamento do hospital, Lana Machado. Alguns dias após a internação, o paciente faleceu e sua filha procurou a chefe de enfermagem para realizar os acertos financeiros, quando foi informada que não havia nenhum valor a ser pago, já que ele teria sido internado pelo SUS.
Posteriormente, a chefe de faturamento teria telefonado para a filha do paciente solicitando seu comparecimento no hospital para realizar o pagamento. Confusa, a mulher citou que havia sido comunicada que não precisaria realizar o acerto, quando a funcionária teria respondido que a informação estava equivocada e foi dita por ‘pessoas não entendiam da administração do hospital e saiam falando bobagens’.
O MPE apurou duas situações distintas, uma delas o fato relacionado à cobrança realizada por Lana, antes da internação e depois do falecimento; e outro fato relacionado ao procedimento cirúrgico realizado pelo médico oncologista, ocorrido cerca de dois meses antes. Para a cirurgia, foi realizado o pagamento dos R$ 8 mil à Blue Med Serviços, com cheque nominal a Fabrício, que é sócio administrador da empresa.
O desfecho do primeiro caso se deu após a confissão da funcionária, que disse ter se apossado de R$ 3.828,04 pagos pela filha do paciente, em cheque nominal ao Hospital de Câncer Alfredo Abrão. A funcionária foi demitida e foi aberto um Inquérito Policial sobre o caso, mas o Ministério Público passou a apurar o funcionamento do sistema de cobranças do hospital, já que havia indícios de não ter sido um caso isolado.
Notas irregulares
A investigação logo apontou que havia uma série de notas fiscais canceladas e não reemitidas no período de abril de 2013 a julho de 2015 pelo hospital. Foram então solicitadas ao diretor da unidade, Carlos Coimbra, informações acerca da realização de auditoria interna para apuração das irregularidades e, à 1ª Delegacia de Polícia Civil, informações sobre o andamento do inquérito que apontava o hospital como vítima de furto qualificado.
Conforme a diretoria do hospital, levantamentos feitos no setor de faturamento e financeiro constataram que não foi emitida nota fiscal da cirurgia realizada pelo médico. Além disso, os honorários pagos ao Servan, serviço de anestesiologia, teriam sido pagos através de cheques pessoais no nome de Fabrício.
Baseado no valor que foi pago ao Servan, R$ 684, o valor dos honorários médicos seria de aproximadamente R$ 1,7 mil e o restante seria pertencente ao hospital para custear as despesas da cirurgia. Pelo fato do médico ter recebido diretamente do paciente o valor de R$ 8 mil, caberia a ele pagar o hospital de suas despesas hospitalares com a internação e cirurgia no particular, o que não ocorreu.
Outros casos
Foi identificado um caso similar em 2013, em que a filha de outro paciente solicitava explicações ao hospital. Na época, como denuncia a mulher, Fabrício disse que o homem precisava realizar uma cirurgia com urgência, mas que no hospital demoraria muito e que, no particular, seria mais rápida e custaria R$ 9 mil. No valor, pago diretamente ao médico, estariam inclusos os honorários dos profissionais e as despesas hospitalares.
O hospital também alega que não recebeu pelo procedimento, não foi gerada nota fiscal dos serviços hospitalares e a responsável pelo setor de faturamento novamente deixou de cobrar o paciente, já que o próprio médico que recebeu dos familiares. O pagamento ao Servan também foi, irregularmente, pago sob o nome de Fabrício.
Além deste, mais quatro familiares de pacientes registraram situação parecida, ocorridas entre 2013 e 2014. Curiosamente, algumas notas fiscais chegaram a ser emitidas ao final de 2014, mas com valores bem abaixo do cobrado pelo médico.
O MPE busca esclarecer se houve pagamento por parte do Hospital de Câncer ao médico pela prestação de serviços e se houve comunicação de internação e realização dos procedimentos para controle por parte da instituição. Para tanto, pede que sejam fornecidas informações completas com a data de internação, alta, valor da emissão da nota fiscal e o valor que deveria ter sido cobrado. A empresa Blue Med e a Polícia Federal também devem dar maiores detalhes sobre os casos.
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