sexta-feira, 31 de julho de 2015

João Amorim mantinha relacionamento íntimo com presidente do TCE-MS


Empresário transitava em todas as esferas do poder para manter o intricado esquema de fraude em licitações

O empreiteiro João Krampe Amorim, pivô da Operação Lama Asfáltica, atuava ativamente nas três esferas do poder tanto no âmbito municipal quanto estadual. Segundo a PF (Polícia Federal), o bom trânsito do empresário no meio político fica evidente também nos diálogos com o presidente do TCE-MS (Tribunal de Contas do Estado), Waldir Neves.

Conforme documentos obtidos pelo Top Mídia News, o empresário procurou o conselheiro para discutir a possível indicação do ex-deputado estadual Antônio Carlos Arroyo e a interferência da Corte Fiscal no processo. Durante os cumprimentos, João chama Waldir de “bonitão” e é tratado como “irmão” pelo amigo.

Em uma das ligações interceptadas pela PF, em 26 de dezembro de 2014, Waldir destaca que quer restabelecer seu relacionamento com Arroyo. Ele afirma que reagiu a uma ação que desmoralizaria o Tribunal, mas que a nomeação do próximo conselheiro era “coisa muito maior que tá por trás [sic]”.

Não há esclarecimentos sobre a ação que o conselheiro teria reagido, mas João Amorim concorda. Waldir ainda emenda que um “amigo” que iria assumir uma vaga na Corte Fiscal havia informado que o Arroyo estava com “ódio mortal” dele. “Pô, e ele agora vai me responsabilizar? Na minha vida, não quero ter mais inimigo de adversário. Já saí da política para não ter adversário, pô [sic],”, reclama.

Mais tarde, Waldir ainda pede desculpas pelo desabafo e garante que está à disposição do empresário para o que for necessário. Os dois se despedem e marcam nova ligação para a segunda-feira, 29 de dezembro. Nesta data, o TCE-MS recorre ao STJ (Supremo Tribunal de Justiça) para manter a nulidade da indicação de Arroyo. Momentos mais tarde, Amorim entra em contato novamente e marca um encontro pessoal com o conselheiro.

As investigações da Operação Lama Asfáltica apontam que o ex-governador André Puccinelli (PMDB) realizou uma verdadeira ‘encenação’ quando indicou Arroyo para a Corte Fiscal. Segundo a Polícia Federal, o ex-deputado seria barrado por questões judiciais abrindo caminho para o ex-secretário estadual de obras, Edson Giroto.

A manobra foi descoberta por Arroyo que ameaçou entregar um dossiê para a imprensa com informações comprometedoras de diversas figuras públicas de Mato Grosso do Sul. As promessas preocuparam Antônio João que passou a negociar pessoalmente com todas as partes envolvidas, inclusive com o próprio Arroyo que planejava fazer a 'devassa' durante a posse do conselheiro Osmar Jeronymo, ex-chefe de gabinete da administração peemedebista.

Desfecho
Seguindo o planejado por Puccinelli, Arroyo chegou a ser indicado para uma vaga na Tribunal de Contas, através do Decreto "P" nº 5.451, de 23 de dezembro de 2014, mas teve o pedido questionado na Justiça. O TCE considerou a aposentadoria do conselheiro José Ricardo Cabral nula, por ter sido enviada para aprovação do Executivo estadual sem a assinatura do conselheiro-corregedor Ronaldo Chadid, que estava viajando na ocasião do imbróglio.

O Tribunal de Justiça declarou a ilegalidade do processo por oito votos a sete, pois, na opinião do desembargador Júlio Roberto Siqueira Cardoso, o ato contém vício insanável, pois, além de o processo administrativo de aposentação ter sido enviado ao governador por autoridade incompetente, os autos entregues a ele eram suplementares e sem validade, puramente cópias do processo original.

Em sua defesa, Júlio ressaltou que o corregedor do TCE é autoridade competente para avaliar o processo de aposentadoria, visto que, na época, era vice-presidente em exercício naquela Corte. Ressaltando que houve flagrante ofensa ao devido processo legal, o desembargador lembrou que ao publicar decreto que efetivava a aposentadoria de José Ricardo, o governador ignorou parecer da Procuradoria do Estado, feito a seu próprio pedido, de que o conselheiro não preenchia os requisitos legais para ser aposentado.

As interferências de João Amorim evitaram o vazamento de informações. Conforme a PF, “parece que os ânimos exaltados foram serenados por alguma espécie de bálsamo, que mostrou que, na verdade, vale a pena engolir sapos e prometer aquilo que jamais será cumprido, perdendo qualquer tipo de credibilidade, pela perpetuação de um esquema que, no final das contas, acaba agradando a todos”.

Além disso, finalizado o impasse judicial, José Ricardo Pereira Cabral resolveu desistir da aposentadoria antecipada, que seria usada para tratamento de saúde. Com 61 anos de idade, ele poderá ficar no posto até 2029, quando os magistrados são obrigados a aceitar a aposentadoria compulsória. Se a vaga for aberta até 2018, o governador Reinaldo Azambuja que indicará o sucessor do conselheiro.
  
Investigações
A Operação Lama Asfáltica investiga uma organização criminosa que teria fraudado diversas licitações em obras públicas de Mato Grosso do Sul. Os suspeitos teriam cometido os crimes de sonegação fiscal, formação de quadrilha, falsidade ideológica, lavagem de dinheiro, corrupção ativa, corrupção passiva e fraudes à licitação.

O nome da operação faz referência a um dos insumos utilizados em obras com indícios de serem superfaturadas identificadas durante as investigações. Durante o cumprimento de mandados e apreensão na casa dos envolvidos, a polícia apreendeu documentos, uma obra de arte e mais de R$ 747,9 mil, em moedas nacionais e estrangeiras. 

Entre os contratos com indícios de fraude aparecem as licitações para a pavimentação da MS-430, que liga o município de São Gabriel do Oeste a Rio Negro, o aterro sanitário de Campo Grande, o Aquário do Pantanal e as Avenidas Lúdio Coelho Martins e Duque de Caxias

A ação da PF em conjunto com a Receita Federal, a Controladoria Geral da União e o Ministério Público Federal cumpriu 19 mandados de busca e apreensão, expedidos pela 5ª Vara Federal de Campo Grande, em residências e empresas dos investigados.

De acordo com a Receita Federal, as investigações começaram a dois anos, quando foram detectados indícios de que importante empresário de Mato Grosso do Sul, possivelmente João Amorim, e diversas pessoas ligadas a ele corromperiam servidores públicos, fraudando licitações e desviando recursos públicos.


Dentre as ações do suposto grupo criminoso consta o direcionamento de licitações a empresários ligados à organização, os quais recebiam valores supostamente superfaturados e repassavam parte dos lucros a servidores coniventes envolvidos. Também foram identificadas vultosas doações para campanhas de políticos, o que justifica o bom trânsito de Amorim em todas as esferas do poder.

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