quinta-feira, 17 de março de 2016

Moro derruba sigilo e divulga grampo de ligação entre Lula e Dilma; ouça


Ligação foi feita às 13h32 desta quarta-feira (16).

Em outra conversa, Lula diz que não iria para o governo para se proteger.

Fernando Castro, Samuel Nunes e Vladimir NettoDo G1 PR e da TV Globo

O juiz Sérgio Moro retirou nesta quarta-feira (16) o sigilo de interceptações telefônicas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. As conversas gravadas pela Polícia Federal incluem diálogo desta quarta com a presidente Dilma Rousseff, que o nomeou como ministro chefe da Casa Civil.(Ouça gravação no vídeo acima)
No despacho em que libera as gravações, Moro afirma que, “pelo teor dos diálogos degravados, constata-se que o ex-Presidente já sabia ou pelo menos desconfiava de que estaria sendo interceptado pela Polícia Federal, comprometendo a espontaneidade e a credibilidade de diversos dos diálogos”.
Moro afirma, ainda, que alguns diálogos sugerem que Lula já sabia das buscas feitas pela 24ª fase da Operação Lava Jato no início do mês. Leia a íntegra do despacho.
O advogado de Luiz Inácio Lula da Silva, Cristiano Zanin Martins, disse que a divulgação do áudio da conversa entre a presidente Dilma Rousseff com Lula é uma 'arbitrariedade' e estimula uma 'convulsão social'.
 Conversa com Dilma
Dilma: Alô
Lula: Alô
Dilma: Lula, deixa eu te falar uma coisa.
Lula: Fala, querida. Ahn
Dilma: Seguinte, eu tô mandando o 'Bessias' junto com o papel pra gente ter ele, e só usa em caso de necessidade, que é o termo de posse, tá?!
Lula:  Uhum. Tá bom, tá bom.
Dilma: Só isso, você espera aí que ele tá indo aí.
Lula: Tá bom, eu tô aqui, fico aguardando.
Dilma: Tá?!
Lula: Tá bom.
Dilma: Tchau.
Lula: Tchau, querida.
O Advogado Geral da União, José Eduardo Cardozo, disse que o diálogo de Dilma, ao contrário da interpretação da oposição, não estava dando a Lula um documento para ele se livrar de possível ação policial.
Segundo o ministro, a presidente estava enviando a Lula o documento chamado termo de posse, para ele assinar. Isso porque Lula, de acordo com Cardozo, estava com problemas para comparecer à cerimônia de posse marcada para quinta-feira (17).
O Planalto emitiu nota em que afirma que vê 'afronta' a direito de Dilma na divulgação do telefonema. Leia na íntegra.
Cargo de ministro
Em outro trecho, Lula afirma que jamais iria para o governo para se proteger.  Ele conversa com Valmir Moraes da Silva e com o governador do Piauí Wellignton Dias.(Ouça na íntegra ao lado)
- Wellington Dias: O Brasil precisa nesse instante de você aqui. Sei que não é uma operação que não é fácil para você. Há, pelo que eu sei, disposição dela [Dilma] e acho que vale a pena, viu presidente?
- Lula: Mas deixa eu te falar, eu vou ter uma conversa com ela, porque não é fácil. Não é uma tarefa fácil. Veja, eu jamais direi ao governo para me proteger.
- Wellington Dias: Não, eu sei. Mas não é para isso. Isso que você está fazendo é uma coisa excepcional. É uma coisa fantástica que você está fazendo se caminhar nas duas direção [sic] o que você está fazendo, essas duas medidas que a gente tá tratando da economia. To aqui para falar com ela [Dilma] sobre isso. Oito partidos, 21 governadores, que dão sustentação às mudanças que ela precisa fazer para a economia. Não tem jeito. Ela tem que aumentar um pouco o endividamento para poder ter dinheiro para fazer esse país.
- Lula: Eu acho, eu acho, eu acho. A coisa mais simples que ela tem que fazer.
Outra conversa que menciona um ministério é travada entre Lula e uma pessoa chamada "Roberto Carlos", que deixa claro que o cargo serviria de foro privilegiado para Lula.
Roberto Carlos: “Eu acho, tá, tem uma coisa que tá na mão de vocês. É ministério, acabou. Agora você tem uma coisa na tua mão, você, o PT, a Dilma... Vai ter porrada? Vai criticar? E daí? Numa boa, você resolve outro problema, que é o problema da governabilidade”.
Influência
O juiz diz que algumas em algumas conversas se fala, aparentemente, "em tentar influenciar ou obter auxílio de autoridades do Ministério Público ou da Magistratura em favor do ex-Presidente". Moro ressalta, porém, que não há nenhum indício nas conversas, ou fora delas, de que as pessoas citadas tentaram, de fato, agido "de forma inapropriada".
"Em alguns casos, sequer há informação se a intenção em influenciar ou obter intervenção chegou a ser efetivada", observa o juiz.
Um dos casos citados por Moro faz referência à Ministra Rosa Weber do Supremo Tribunal Federal (STF), "provalvemente para obtenção de decisão favorável ao ex-Presidente na ACO 2822". Na ocasião, Weber negou pedido apresentado pela defesa do ex-presidente para suspender duas investigações sobre um triplex em Guarujá (SP) e um sítio em Atibaia (SP) ligados a ele.
"A eminente Magistrada, além de conhecida por sua extrema honradez e retidão, denegou os pleitos da Defesa do ex-Presidente", afirmou Moro.
Sobre o assunto, Lula falou com Dilma sobre o pedido feito pela defesa dele ao STF. “Eu acho que eles queriam antecipar o pedido nosso que tá na Suprema Corte, que tá na mão da Rosa Weber”, disse o ex-presidente.
Depois do diálogo com Dilma, Lula conversa com o então ministro chefe da Casa Civil, Jaques Wagner, e solicita que ele converse com Dilma a respeito “de negócio da Rosa Weber”.
Lula: “Mas viu, querido, ela tá falando dessa reunião, ô Wagner, que queria que você visse agora, falar com ela, já que ela tá aí, falar o negócio da Rosa Weber, que tá na mão dela pra decidir. Se homem não tem saco, que sabe uma mulher corajosa possa fazer o que os homens não fizeram”.
Outro ministro que também aparece nos diálogos é Ricardo Lewandowski. "Há diálogo que sugere tentativa de se obter alguma intervenção do Exmo. Ministro Ricardo Lewandowski contra imaginária prisão do ex-Presidente, mas sequer o interlocutor logrou obter do referido Magistrado qualquer acesso nesse sentido", consignou o juiz.
A ministra Rosa Weber e a presidência do STF informaram que não iriam comentar o caso.
Jaques Wagner condenou o  vazamento da conversa grampeada dos telefones do ex-presidente Lula, da presidente Dilma e do seu aparelho. "Sempre apoiei as investigações, mas vazamento de conversa com a presidenta da República extrapolou os limites e a segurança dela ", disse.
O ministro explicou que Lula apenas lhe solicitou que transmitisse essa mensagem, o que ele não teve oportunidade de fazer, pois já tinha terminado seu encontro com ela.
"Achei uma arbitrariedade. Não se pode violar e interceptar o telefone da presidenta da República", comentou o ministro. Ele informou que vai apurar como o telefone da presidenta Dilma conseguiu ser grampeado.
Eugênio Aragão
Moro afirma também que há menção ao recém nomeado Ministro da Justiça Eugênio Aragão, sobre quem Lula diz que "parece nosso amigo", mas de quem reclama porque "este não teria prestado qualquer auxílo". "Eu às vezes fico pensando até que o Aragão deveria cumprir um papel de homem naquela p..., porque o Aragão parece nosso amigo, parece, parece, mas tá sempre dizendo 'olha...'.", diz trecho da conversa. (Ouça a gravação ao lado)
Eugênio Aragão informou que não iria se manifestar.
O juiz registra no despacho que registrou essas referências "apenas para deixar claro que as aparentes declarações pelos interlocutores em obter auxílio ou influenciar membro do Ministério Público ou da Magistratura não significa que esses últimos tenham qualquer participação nos ilícitos". Para Moro, porém, isso "não torna menos reprovável a intenção ou as tentativas de solicitação".
Operação
No dia 27 de fevereiro, dias antes do cumprimento do mandado de condução coercitiva contra Lula pela Operação Lava Jato, Lula conversou com o presidente do PT Rui Falcão sobre o assunto.
Lula: “É, eu tô esperando segunda-feira. Eu tô esperando segunda-feira a Operação de busca e apreensão na minha casa, do meu filho Marcos, do meu filho Fábio, do  meu filho Sandro, do meu filho Claudio”. 
Rui Falcão: “É, eu vi esse noticiário aqui”.
Campanha de 2018
Logo após deixar o aeroporto de Congonhas, onde prestou depoimento para a força-tarefa da Operação Lava Jato no início do mês, Lula criticou as investigações em conversa telefônica com Dilma. O ex-presidente diz para Dilma que irá aproveitar a militância e antecipar a campanha para 2018.
"Eu, estou dizendo aqui pro PT, Dilma que não tem mais trégua, não tem que ficaracreditando na luta jurídica, nós temos que aproveitar a nossa militância e ir pra rua. Eu sinceramente, que tô querendo me aposentar, eu vou antecipar minha campanha pra 2018, eu vou acertar de viajar esse país a partir da semana que vem, sabe?! E quero ver o que vai acontecer. É, lamentavelmente, vai ser isso, querida. Eu não vou ficar em casa parado", afirmou Lula.
'República de Curitiba'
Na sequência da conversa, em que Dilma e Lula criticam a divulgação da delação premiada do senador Delcídio do Amaral (sem partido-MS), Lula faz referência ao que ele chama de "República de Curitiba".
"Nós temos uma Suprema Corte totalmente acovardada, nós temos um Superior Tribunal de Justiça totalmente  acovardado, um parlamento totalmente acovardado, somente nos últimos tempos é que o PT e o PC do B é que acordaram e começaram a brigar. Nós temos um Presidente da Câmara f....., um presidente do Senado f....., não sei quanto parlamentares ameaçados, e fica todo mundo no compasso de que vai acontecer um milagre e que vai todo mundo se salvar. Eu, sinceramente, tô  assustado com a 'República de Curitiba'. Porque a partir de um juiz de primeira instância, tudo pode acontecer nesse país".
Espetáculo
Na mesma conversa, o ex-presidente afirma que o juiz Sérgio Moro "quis fazer um espetáculo, antes da decisão daquele negócio que tá no Supremo pra decidir, a gente não  sabe se é contra ou a favor, mas ele precisava fazer um espetáculo de pirotecnia. As perguntas foram as mesmas que eu  já  respondi ao MP e a dois delegados da PF", disse Lula
Ele segue criticando as apreensões nas casas dos filhos e dos membros do Instituto Lula, como Clara Ant. "A Clara tava dormindo sozinha quando entrou cinco homens lá dentro, ela pensou que era presente de Deus, era a Policia Federal, sabe? então...(risos)".
Dilma respondeu: "Ela pensou que era um presente de Deus? (risos)"
"Então é isso Dilma, eu acho que foi um espetáculo de pirotecnia. A tese deles é de que tudo que tá acontecendo foi uma quadrilha montada em 2003 e que portanto, sabe, ela perdura até hoje, sabe? E dentro do Palácio, é a tese deles, é a tese deles. Então eles não precisam de explicação, como a teoria do domínio do fato não precisava de explicação, o crime estava dado, agora é o seguinte a imprensa diz que é criminoso e eles colocam em prática", criticou Lula.
Eduardo Paes
No mesmo dia em que foi deflagrada a 24ª fase da Lava Jato, Lula conversou com o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes. O prefeito diz que está sofrendo, e Lula rebate dizendo que ele é abençoado por Deus, por causa das Olimpíadas. Paes responde que fazer Olimpíadas com Lula e Sérgio Cabral (ex-governador do RJ) é uma coisa, mas "segurar com aquele bom humor da Dilma e do Pezão...”. Lula diz: "Não é facil, querido...".
Na sequência da conversa Paes diz para Lula: "Agora da próxima vez você para com essa vida de pobre, com essa alma de pobre comprando esses barcos de m...., sitiozinho vagabundo”. Lula ri, e Paes continua: “O senhor tem uma alma de pobre. Eu, todo mundo fala aqui no meio, imagina se fosse aqui no Rio esse sítio dele. Não é em Petrópolis, não é em Itaipava, é como se fosse em Maricá”. Lula segue rindo.
O prefeito Eduardo Paes informa que, em uma conversa completamente informal com o ex-presidente Lula, fez brincadeiras que podem soar de mau gosto. E, por isso, pede desculpas a todos que tenham se sentido ofendidos, especialmente à população de Maricá.
Janot
Em relatório feito a partir dos áudios, a PF traz trecho em que Lula comenta com Luiz Carlos Sigmaringa Seixas que Rodrigo Janot, procurador-geral da República, recusou quatro pedidos de investigação do senador Aécio Neves, mas aceitou um único contra ele.
“Em seguida, Lula sugere que Janot, como forma de gratidão por ter sido nomeado por ele, não poderia ter aceitado o pedido de investigação: ‘Essa é a gratidão...Essa é a gratidão dele por ele ser Procurador’”, afirmou Lula, segundo a PF.
Conforme os investigadores, Sigmaringa Seixas sugere utilizar a imprensa para constranger Janot, ao que Lula responde: “Então conversa com o Cristiano”. A conversa termina em seguida.
Rodrigo Janot está em viagem e não foi localizado para comentar.
O advogado Sigmaringa Seixas afirmou que se tratou de uma conversa correta, com uma orientação de que qualquer reclamação ao procurador-geral da República Rodrigo Janor deveria ser dirigida formalmente, por meio de uma petição.
Ele afirmou que se trata de "um absurdo inominável" a divulgação de escutas telefônicas objetos de investigação, e que isso mostra uma divulgação seletiva "com propósitos eminentemente políticos".
Procurador de Rondônia
Segundo a interpretação da Polícia Federal, em uma conversa com o ex-ministro Paulo Vanuchi, Lula sugere levantar provas para acusar o procurador de Rondônia Douglas Kirchner, que foi acusado de participar de castigos contra a própria mulher. O caso foi arquivado pelo Conselho Superior do Ministério Público Federal. Kirchner investiga Lula em um caso de suposto tráfico de influência para favorecer empreiteiras a conseguir empréstimos com o BNDES. (Ouça na íntegra ao lado)
Lula: "Nós vamos pegar esse de Rondônia agora, eu vou colocar a Fátima Bezerra e a Maria do Rosário em cima dele".
Paulo Vannuchi: "É isso mesmo!".
Lula: "Sabe porque, eu até tirei um sarro da Clara Ant de ficar procurando o que fazer, faz um movimento das mulheres, contra esse f.. d. p...! Ele batia na mulher, levava a mulher no culto religioso, deixava ela sem comer, dava chibatada nela, sabe?! Cadê as “mulher de grelo duro” lá do nosso partido?!"
Paulo Vannuchi: "(risos) É isso, mestre!"
Nelson Barbosa
Em uma das ligações interceptadas pela Polícia Federal, Lula fala para o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, acompanhar o que a Receita Federal está fazendo junto com a Polícia Federal.
Lula: "Ô, Nelson, te falar uma coisa por telefone, isso daqui. O importante é que a Polícia Federal esteja gravando. É preciso acompanhar o que a Receita está fazendo junto com a Polícia Federal, bicho!".
Nelson Barbosa: "Não, é... Eles fazem parte".
Lula: "É, mas você precisa se inteirar do que eles estão fazendo no instituto. Se eles fizessem isso com meia dúzia de grandes empresas, resolvia o problema de arrecadação do estado".
Nelson Barbosa: "Uhum, sei".
Lula: "Sabe? Eu acho que eles estão sendo (e fala um palavrão)".
Nelson Barbosa: "Tá".
Lula: "Tão procurando pelo em ovo. Eu acho... Eu vou pedir pro Paulo Okamotto botar tudo no papel, porque era preciso você chamar o responsável e falar (ele fala um palavrão): 'vocês estão fazendo o mesmo com a Globo, com Instituto Fernando Henrique Cardoso, o mesmo com Gerdau, o mesmo com o SBT, o mesmo com a Record! Ou só com o Lula'?".
Após palavrões de Lula, Nelson Barbosa responde: "Tá, pede pro Paulo colocar".
O Ministério da Fazenda emitiu nota esclarecendo que, até o momento, não recebeu manifestação formal do Instituto Lula a respeito da atuação da Receita Federal. Segundo a nota, o Ministério da Fazenda e a Receita Federal dispõem de instrumentos institucionais, que podem ser acionados por qualquer contribuinte, para apurar eventuais excessos ou desvios de conduta de seus servidores.
Fim do sigilo
Segundo Moro, o “levantamento [do sigilo] propiciará assim não só o exercício da ampla defesa pelos investigados, mas também o saudável escrutínio público sobre a atuação da Administração Pública e da própria Justiça criminal”. “A democracia em uma sociedade livre exige que os governados saibam o que fazem os governantes, mesmo quando estes buscam agir protegidos pelas sombras”, escreveu.
Ainda conforme o magistrado, o sigilo também não se justifica em razão de a “prova ser resultante de interceptação telefônica”. “Sigilo absoluto sobre esta deve ser mantido em relação a diálogos de conteúdo pessoal inadvertidamente interceptados, preservando-se a intimidade, mas jamais, à luz do art. 5º, LX, e art. 93, IX, da Constituição Federal, sobre diálogos relevantes para investigação de supostos crimes contra a Administração Pública”, argumentou.
Envio ao STF
Ao fim do despacho, Moro informa que, diante da notícia de que Lula aceitou convite para ocupar o cargo de ministro chefe da Casa Civil, as investigações serão enviadas ao Supremo Tribunal Federal. O material deve ser enviado após a posse, que está marcada para terça-feira (22).
Lula (Foto: Reprodução)

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